Cannabis no combate a dor crônica: uma alternativa para 27 milhões de brasileiros

A dor é uma das patologias com o maior número de evidencias científicas que apontam para a eficácia da cannabis em seu tratamento

Publicada em 15/08/2024

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Por Bruno Vargas

As dores crônicas fazem parte da rotina de quase 37% dos brasileiros com mais de 50 anos, conforme dados do último Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos (ELSI-Brasil). Segundo a médica clínica geral Carolina Dantas, 27 milhões de brasileiros sofrem de dor crônica decorrente de alterações na coluna vertebral, com as discopatias, como as hérnias de disco, sendo as principais causadoras da dor.

O estudo do ELSI-Brasil também apontou que 30% dos portadores de dor crônica com mais de 50 anos utilizam opioides como tratamento. Comprometimento da memória, náusea e vômitos, depressão, diminuição da libido e insuficiência respiratória — podendo levar à morte — são alguns dos sintomas a curto e longo prazo que o uso de opioides pode causar, conforme a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).

Segundo Dantas, a cannabis é uma ótima alternativa no combate à dor, sendo eficaz na diminuição de seus sintomas e apresentando poucos efeitos adversos, diferentemente dos opioides.

 

 

O que é a dor crônica


A dor crônica pode ser caracterizada por persistir por mais de três meses; durar mais de um mês após a resolução da lesão ou problema que originalmente causou a dor; ocorrer e desaparecer novamente por meses ou anos; e/ou estar associada a uma doença crônica (como câncer, artrite, diabetes ou fibromialgia) ou a uma ferida que não cicatriza, segundo o Manual MSD.

A primeira definição de dor crônica recomendada pelo Subcomitê de Taxonomia e aceita pelo Conselho da Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) caracteriza a patologia como "uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada a uma lesão tecidual real ou potencial, ou descrita nos termos de tal lesão."

Na dor crônica, o sistema nervoso recebe um sinal constante de dor do corpo, que pode durar anos. A dor, às vezes, afeta os hábitos de vida diários das pessoas, causando insônia ou má qualidade do sono, irritabilidade, depressão, alterações de humor, ansiedade, fadiga e perda de interesse pelas atividades rotineiras. "O impacto da dor, do sofrimento na qualidade de vida das pessoas é indiscutível", comenta a médica, que atua no município de Itacaré, Bahia.

"O profissional de saúde tem como dever modular e estabilizar a dor. Olhar para estratégias onde podemos trazer qualidade de vida para os nossos pacientes, sem efeitos adversos, é uma responsabilidade e importância", completa.

 

Cannabis na diminuição da dor crônica


"Centenas dos meus pacientes já melhoraram com o uso dos canabinoides, pessoas com diversos tipos de dor, articulares, neuropáticas, oncológicas, reumáticas e musculoesqueléticas", comenta Dantas. Hoje, a dor é uma das patologias com o maior número de estudos científicos que comprovam a eficácia da cannabis em seu tratamento.

 

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Carolina Dantas durante o Congresso Brasileiro da Cannabis Medicinal 2024/ imagem: Arquivo Sechat

 

Uma revisão sistemática intitulada "Cannabis sativa – Uso de fitocanabinoides para o tratamento da Dor Crônica", extraída de artigos de bancos de dados como SciELO, PubMed, Lilacs e Google Acadêmico, revela que, entre os 54 estudos encontrados, 22 foram utilizados como referência após seleção de dados importantes sobre o tema. A maioria sugere eficácia na redução da dor e da alodinia (dor induzida por estímulos que geralmente não causam desconforto), além de demonstrar alta tolerabilidade e efeitos adversos considerados de leves a moderados, que não prejudicam significativamente as atividades do cotidiano. Ou seja, a modulação do CBD sobre o THC reduz significativamente as dores crônicas, segundo as pesquisas.

Atuando em diversos receptores do corpo humano, como o receptor CB2, vaniloides, serotoninérgicos e outros receptores moduladores, o CBD é capaz de estimular uma ação analgésica, diminuindo a sensibilização da dor. Atualmente, pomadas e géis à base de cannabis são capazes de atuar diretamente no local da dor, aliviando os sintomas e auxiliando na reparação de uma possível lesão.

Quanto ao THC, ele "possui um efeito analgésico muito potente, comparável ao dos opioides, mas sem os efeitos negativos", segundo Dantas. O estudo brasileiro "Uso de canabinoides na dor crônica e em cuidados paliativos", realizado por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e publicado na Revista Brasileira de Anestesiologia em 2008, mostrou que o THC puro e respectivos análogos apresentam aplicabilidade clínica, o que demonstra os benefícios contra diversos tipos de dor, inclusive a neuropática.