Mounjaro, Ozempic e Canabinoides: comparando tratamentos para diabetes e obesidade

Entenda os prós e contras de cada alternativa

Publicado em 01/09/2024
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De acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes, existem atualmente no Brasil mais de 13 milhões de pessoas vivendo com a doença, o que representa 6,9% da população nacional. O número de amputações de membros inferiores no país, decorrentes de complicações da diabetes, também é um problema grave. Somente em 2022, cerca de 10.168 pacientes tiveram que passar por esse processo, 3,9% maior que total do ano anterior (9.781), o que alerta a sociedade médica para alternativas que otimizem esses dados. 

A fisiopatologia da doença está relacionada a uma resistência à ação da insulina associada à uma disfunção progressiva das células beta do pâncreas, levando à deficiência relativa ou absoluta da secreção deste hormônio.  Além da dieta restrita em açúcar e atividade física, podem ser utilizados medicamentos de distintas classes como as biguanidas, sulfonilureias, meglitinidas, glitazonas, tiazolidinedionas, inibidores da dipeptidil peptidase 4 e os agonistas dos receptores do GLP-1.

A tirzepatida (princípio ativo do Mounjaro) e a semaglutida (princípio ativo do Ozempic) pertencem à mesma classe de medicamentos análogos à GLP-1. Eles recebem esse nome porque simulam a ação agonista de uma incretina ou hormônio intestinal no receptor do “peptídeo semelhante ao glucagon 1” (glucagon-like-peptide 1 ou GLP-1), que provoca a sensação de saciedade e a redução da velocidade da digestão da comida. Porém, enquanto a substância do Ozempic reproduz apenas a ação do GLP-1, a do Mounjaro é um duplo agonista e estimula o GLP-1 e o GIP. Por isso, a tirzepatida é considerada uma nova geração dos medicamentos. Em indivíduos com diabetes tipo 2, o efeito da incretina tem diminuído. O efeito terapêutico desta ação, focada nas incretinas, é de duas a três vezes maior do que a resposta da secreção de insulina, além de promover a sensação de saciedade, reduzir o apetite, diminuir a ingestão de calorias e produzir a consequente perda ponderal que combate a obesidade, as  incretinas popularizam a ação off label do medicamento.

Ambas as drogas visam estimular o pâncreas a produzir mais insulina e inibir a liberação de glucagon, um hormônio que aumenta os níveis de açúcar no sangue, além de retardar a digestão dos alimentos, o que ajuda a evitar que os níveis de açúcar no sangue subam muito depois de comer. Tanto um produto, quanto outro, são drogas muito eficazes na  perda de peso, mas o Mounjaro evidenciou uma perda 7,2% maior que o Ozempic.

Em um estudo comparativo, dos 1.879 participantes diagnosticados com diabetes há 8,6 anos e com um peso inicial de 93,7 kg, foi observado uma redução média de 4,3 kg naqueles que receberam Mounjaro, versus 2,8kg dos pacientes que tomaram Ozempic após 40 semanas de tratamento. No entanto, o grupo de pessoas que usaram tirzepatida relatou eventos adversos mais graves e a uma maior porcentagem de pessoas que pararam de usá-lo por esses efeitos adversos. Os efeitos colaterais mais comuns relatados no estudo foram:

Mounjaro X Ozempic: Náusea (37,2% x 18%), Diarréia (36,4% x 12%), Vômito (24,5% x 8%), Dor abdominal (24,1% x 8%), Constipação (10,7% x 8%). Os dois são medicamentos injetáveis de aplicação semanal. O Ozempic esta disponível em 0,25 mg, 0,5 mg e 1 mg e o Mounjaro nas versões de 2,5 mg, 5 mg, 7,5 mg, 10 mg, 12,5 mg e 15 mg. Sendo indicado iniciar o tratamento com as dosagens mais baixas para evitar efeitos adversos. O valor de cada caixa, também varia bastante entre os dois medicamentos, custando o Ozempic entre R$ 1.143,82 e R$ 1.289,75, e de R$ 1.677,10 a R$ 3.782,17 do Mounjaro, a depender da alíquota do ICMS em cada estado.

Mas e a cannabis?

 

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O THCV é dos 200 compostos medicinais da cannabis | Imagem: Vecteezy

 

O sistema endocanabinóide (SEC) modula a ingestão alimentar e a homeostase energética e a super ativação crônica do SEC, foi identificada na obesidade e no diabetes tipo 2. O sistema exerce algumas das suas ações ativando os receptores canabinoides 1 (CB1) e 2 (CB2). 

O THC, por sua vez,  é um agonista parcial do CB1. Os estudos indicam que a sinalização periférica do receptor CB1 pelo delta-9 THC promove o aumento da ingestão de alimentos saborosos, provocando o efeito orexígeno da substância, conhecida popularmente como “larica”, termo utilizado para o aumento do apetite provocado no uso adulto da maconha.

As evidências científicas revelam que, apesar do consumo agudo de cannabis com alto teor de THC estar correlacionado com o aumento no consumo de alimentos, o consumo crônico da planta está paradoxalmente associado com taxas mais baixas de obesidade e probabilidade reduzida de desenvolver diabetes tipo 2 em humanos.

A modulação dos receptores CB1 com rimonabanto (um canabinoide sintético antagonista/agonista inverso do CB1R) levou a uma redução significativa no peso corporal, circunferência da cintura, concentrações de triglicerídeos (TG), um aumento nas concentrações de colesterol HDL e da adiponectina, também como uma redução na HbA1c em indivíduos com diabetes tipo 2. No entanto, a autorização de comercialização do produto foi proibida em 2008 devido a um aumento na incidência de eventos adversos (EAs) por efeitos psiquiátricos significativos.

É importante ressaltar que os receptores CB1 controlam a preferência alimentar aguda por alimentos altamente palatáveis, ou seja, gostosos e calóricos. Curioso é que as células enteroendócrinas L e K, que produzem as incretinas peptídeo 1 semelhante ao glucagon e o polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose GLP1 e GIP, respectivamente, também possuem receptores CB1. As incretinas GLP1 e GIP, ativam seus respectivos receptores ao longo eixo gástrico-pancreático para aumentar a secreção de insulina e são responsáveis por 50-70% de toda a secreção pós-prandial.

Em modelos animais de obesidade (ratos geneticamente obesos), 4 semanas de tratamento com CBD 3 mg/kg produziram um aumento de 55% na concentração de HDL-C e reduziram o colesterol total em cerca de 25%. Além disso, reduziu os triglicerídeos hepáticos e aumentou a concentração de glicogênio e adiponectina. Há também evidências de estudos em animais que mostram que o CBD modula a resposta cardiovascular ao estresse.

THCV como alternativa promissora

 

O Δ9-Tetrahidrocanabivarina (THCV) é um análogo natural do THC, mas com efeitos farmacológicos diferentes. Foi relatado que ele se comporta tanto como um agonista de CB1/CB2 quanto como um antagonista neutro de CB1/CB2 a depender da dose, com agonismo observado em doses altas e antagonismo em doses baixas.

Estudos pré-clínicos com o composto, demonstraram a produção de hipofagia e redução de peso em ratos magros e melhora da tolerância à glicose e a sensibilidade à insulina em ratos obesos induzidos por dieta. Além disso, resultados semelhantes foram observados utilizando canabidiol (CBD) em camundongos geneticamente obesos, reduzindo a incidência e interrompendo o aparecimento de diabetes em camundongos diabéticos não obesos.

A administração intraperitoneal aguda de THCV em roedores nas doses de 3,10 e 30 mg/kg de peso corporal causou hipofagia e perda de peso. Num outro estudo, envolvendo ratos obesos induzidos por dieta, o THCV oral (2,5-12,5 mg/kg) reduziu o conteúdo de gordura corporal, aumentou o gasto energético e reduziu a insulina em jejum e a resposta à insulina de 30 minutos ao teste oral de tolerância à glicose (TTGO). Neste mesmo estudo, em ratos geneticamente obesos, foi observado um aumento semelhante no gasto energético de 24 horas com 3 mg/kg de THCV, enquanto 12,5 mg/kg de THCV causou uma redução significativa nos TG hepáticos. Em camundongos geneticamente obesos, uma proporção de 1:1 de uma combinação de THCV e CBD (3:3 mg/kg) reduziu a alteração nos níveis de colesterol total em 19% e aumentou o HDL-C em 50%. A mesma combinação reduziu os TG hepáticos, aumentou os níveis de glicogênio hepático, reduziu a insulina em jejum e aumentou o gasto energético.  

Um estudo randomizado, duplo-cego, controlado por placebo, foi conduzido em 2016 no Reino Unido para avaliar a eficácia e segurança do canabidiol e da tetrahidrocanabivarina (THCV) nos parâmetros glicêmicos e lipídicos em pacientes com diabetes tipo 2. Com 62 indivíduos maiores de 18 anos com diabetes tipo 2, hemoglobina glicada <10, sem uso de medicações (metformina, sulfonilureia, inibidor da dipeptidil peptidase-4 ou terapia com peptídeo semelhante ao glucagon 1 GLP-1) por 3 meses antes da triagem e sem quaisquer alterações na dieta ou exercícios durante 4 semanas antes da randomização, foram administrados durante 13 semanas:

 

1- CBD (100 mg duas vezes ao dia), 
2- THCV (5 mg duas vezes ao dia), 
3- proporção de 1:1 de CBD e THCV (5 mg/5 mg, duas vezes ao dia), 
4- proporção de 20:1 de CBD e THCV (100 mg/5 mg, duas vezes ao dia) ou 
5- placebo.

 

Os resultados foram promissores. O THCV melhorou significativamente a resposta glicêmica em 3 horas, reduziu a concentração de glicose plasmática em jejum em comparação com o placebo desde o início até o final do tratamento (de 7,4 para 6,7 mmol/L no grupo THCV vs. 7,6 a 8,0 mmol/L no grupo placebo).

O composto por si só e em combinação com o CBD, não teve efeito nas concentrações de hormônios sinalizadores intestinais, incluindo GLP-1, GIP e grelina. No entanto, numa análise posterior, para a qual as concentrações pós-tratamento foram comparadas com os valores basais (em vez do placebo), o CBD causou um aumento significativo na concentração de GIP, sem qualquer efeito nas concentrações de GLP-1 ou grelina. 
No estudo, o tratamento com THCV não teve efeito na concentração de HDL-C. No entanto, produziu um aumento significativo na Apo A sérica, quando comparado com o placebo. A Apo A constitui 90% da proteína HDL e constitui um importante componente estrutural da partícula HDL. Estas descobertas sugerem que o THCV pode representar um novo agente terapêutico para o controle glicêmico em indivíduos com diabetes tipo 2. 

Atualmente, o custo de um produto rico em THCV (1000mg/ml) é de aproximadamente R$ 715,39. Considerando o valor de R$3.782,17 do Mounjaro/caixa, este tratamento dependerá do investimento de R$126/dia. Por esta razão o Mounjaro tem sido considerado o Ozempic dos ricos e, sem dúvidas, o valor de investimento é algo que tem sido levado em consideração para a maior parte dos brasileiros. 
Apesar de agirem em vias distintas, como especificado no artigo, o THCV pode ser considerado uma alternativa complementar ao tratamento da DM2, obesidade e para auxiliar a perda de peso com um custo monetário e de efeitos adversos bem menores ao paciente.

Recentemente uma jovem paciente de 32 anos, com sintomas ansiosos, compulsão alimentar e obesidade (KG: 121 kgs ALTURA: 1.70 cm, IMC 42), teve uma perda ponderal de 5kg em 30 dias utilizando, 7,9mg THCV 1x/dia e 30mg CBD 12/12hs. Como a dosagem do THCV está sendo realizada separadamente do CBD, foi possível observar o efeito de cada substância. A paciente descreve que o THCV lhe dá energia e disposição para realização cotidiana de exercícios, enquanto o CBD a deixou mais calma, menos ansiosa, mais resiliente com seu próprio corpo e com menos compulsão alimentar. Outra paciente com 37 anos de idade, magra, porém com cintura abdominal maior do que a desejada, refere rápida redução da cintura abdominal com o uso de 10mg THCV em 1 mês, associado aos treinos regulares em academia 4x/semana que já realizava antes do tratamento.

Por fim, se você está disposto a emagrecer “custe o que custar”, ou busca alternativas mais naturais para complementar seu tratamento, considere os canabinoides THCV e o CBD como uma boa opção, mas lembre-se que a base de todo tratamento médico se fundamenta em alterações do estilo de vida, com uma a  alimentação saudável e o exercício físico regular. Para um cuidado adequado do peso, busque a assistência de um profissional médico e nutricionista capacitados.