Saiba como a cannabis melhorou a qualidade de vida de mãe e filha

Médica relata história familiar de sucesso no tratamento com cannabis para várias patologias

Publicada em 06/06/2024

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Por Bruno Vargas

Durante seu período na Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, onde fez residência clínica e geriatria, a médica Gabriela Mânica nunca ouviu falar das diversas propriedades medicinais da cannabis. Seu primeiro contato com a planta aconteceu cerca de cinco anos após, em 2020, quando sua irmã buscou nas redes sociais um tratamento alternativo para a mãe, Bernadete, portadora de Alzheimer.

“No início, por ignorância e preconceito, eu e meu irmão não aceitamos a cannabis como alternativa ao tratamento da nossa mãe. Ainda bem que a Priscilla (irmã), mesmo assim, decidiu marcar uma consulta. Quinze dias depois de começar a usar o óleo as melhoras já eram muito perceptíveis”, relata Gabriela ao falar do início do tratamento canábico da sua mãe.

Durante uma das viagens em família, a médica entendeu o que a cannabis podia fazer pela qualidade de vida da Bernadete. “Me lembro como se fosse hoje. Estávamos na praia, eu e meus irmãos conversando e ela quietinha. Perguntei se estava tudo bem e a mãe me respondeu ‘sim, estou prestando atenção na conversa de vocês’. Tinha anos que isso não acontecia, foi incrível ver ela tranquila, entendendo o mundo daquele jeito.”

Hoje, oito anos após o diagnóstico de Alzheimer, Bernadete, de 64 anos, tem um quadro controlado e menos avançado que outros portadores da patologia. Além do uso da cannabis, com início há cerca de quatro anos, dona Dete, apelido carinhoso, realiza terapias com pintura, música, fisioterapia e recebe todo o carinho e cuidado familiar.

A mãe da médica Gabriela também mantém alguns medicamentos modificadores, antipsicóticos e antidepressivos em baixa quantidade. “É um tratamento em conjunto. Realizamos um acompanhamento contínuo e constante”, relata Mânica. 

Qual seria o cenário sem a cannabis?

Gabriela, ao lembrar dos primeiros anos de diagnóstico da mãe, revela uma preocupação no caso da cannabis não ter entrado na vida de dona Dete. “Uma experiência que me marcou muito foi quando a mãe perguntou ao meu irmão se ele tinha uma namorada. Ele é casado há oito anos. Esses momentos são difíceis. Às vezes penso em que ‘pé’ estaríamos sem a cannabis.”

Além desse relato, a médica lembra das viagens “conturbadas” com a mãe. Por conta do Alzheimer, Bernadete constantemente ficava irritada, agressiva e confusa. “Ela confabulava sozinha. Achava que estávamos rindo ou falando dela, escondendo alguma coisa”, comenta Mânica.

Cannabis: alternativa para a família

Na família Mânica, a segunda paciente canábica foi Priscila, de 38 anos, que desde pequena sofria com um quadro de enxaqueca crônica, agravado em 2022. “Ela foi hospitalizada diversas vezes, durante uma dessas passagens foi testado um tratamento com Ketamina - nunca tinha visto antes no Brasil. A situação era muito complicada dois anos atrás”, relata Gabriela.

Segundo a médica, depois de deixar o hospital, sua irmã continuou tomando altas doses de medicamentos controlados até que um dia, Gabriela decidiu testar a cannabis.

Agora, dois anos depois de começar o tratamento, a qualidade de vida da sua irmã melhorou consideravelmente. “A gente começou a conhecer a Priscila de verdade. Antes tudo era um gatilho: barulho, música, calor, tudo ativava a enxaqueca. Hoje ela é uma pessoa super extrovertida, consegue aproveitar melhor os momentos com a família e os amigos.”

Paciente nº 3

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Dra. Gabriela Mânica

“Sempre fui ansiosa. Amo meu trabalho, mas me sentia sobrecarregada, exausta. Cheguei a ter um burnout. Por isso me tornei minha terceira paciente de cannabis e agora me sinto muito melhor”, relata Gabriela, que iniciou o uso da maconha medicinal para tratar a sua ansiedade e teve melhoras, também, na psoríase, condição decorrente de um câncer de tireoide vencido aos 18 anos.

Atrelada à ansiedade, a psoríase é uma doença autoimune caracterizada por criar feridas na pele. Depois de 12 anos tentando diversos tratamentos (corticoides, infusão de metotrexato), Gabriela finalmente achou uma medicação capaz de frear o impacto da patologia.

“Viajei para a África recentemente e fiquei 20 dias sem o óleo. Mesmo estando de férias, com a ansiedade controlada, a psoríase voltou. Quando cheguei no Brasil, alguns dias depois de retomar o uso da cannabis, a doença estava controlada”, relata a médica.

Segundo ela, além da melhora na ansiedade e no controle da psoríase, a cannabis possibilitou uma maior aproximação com os seus pacientes. “Meu foco, minha relação sensorial e emocional durante a consulta melhoraram muito. Me sinto uma profissional mais preparada e atenciosa.”

Informação é a chave

Finalizando uma especialização em geriatria na Santa Casa de SP, Gabriela enxerga a educação e a informação como pontos cruciais no combate ao preconceito. Hoje, a médica que atende cerca de 600 pacientes compartilha suas experiências com a mãe nas redes sociais.

“Tenho medo de ter minha conta derrubada por estar falando de cannabis, mas quando recebo relato de pacientes entendo a importância em divulgar, estou fazendo o certo.” Mânica completa afirmando que, mesmo não tendo as redes sociais voltadas para médicos, sua DM é lotada de solicitações de profissionais da saúde, que querem começar a prescrever cannabis.